sábado, 18 de julho de 2009

Mais um conto...

Ana Paula

O vaso branco com um rolo de papel higiênico estava no canto direito da imagem. O azulejo branco do chão parecia ser realmente novo como dizia a notícia. No canto esquerdo superior estava um chuveiro simples. Branco. Ao chão, um xampu e uma saboneteira com um sabonete. A foto era em preto e branco, mas dizia na legenda ser um quarto, um cômodo. Não tinha divisórias. Som ou televisão não se via na foto. O material das paredes não foi possível identificar. Ele servia para isolar o som.
Sentado na cadeira de madeira pesada e trabalhada eu aguardava ela chegar. Era um quarto de hotel. Numa cidade do interior de Minas Gerais. Um hotel rústico, antigo casarão. Típico das históricas cidades mineiras. Ela chegaria por volta das 23 horas.
O telefone toca em cima da pequena mesa quadrada e simples que fica no canto próximo à janela do quarto. É um aparelho antigo, preservado para compor a atmosfera poética das belas antiguidades. Inspirar aquela atmosfera era encontrar a poesia de tempo antigos que a história e a arte jamais desistem de preservar.
Me levanto após colocar o telefone no gancho e deixo o jornal com a foto em cima da pequena e velha mesa quadrada. Olho para a cama de casal. Arrumada, dois travesseiros grandes e duas cobertas grossas para me cobrir e me esconder do frio. As cobertas eram de fios grossos, seus desenhos eram quadriculados. Eram pesadas e quentes. Escutei seus passos se aproximando da porta bem cuidadosamente.
Eu estava longe da minha cidade e por alguns instantes larguei minha vida e casa para trás. Resolvi viajar e dormir em algum hotel de alguma cidade interior. Meu celular desliguei para não ser encontrado nessa noite. Apesar de estar na cidade natal do grande poeta Carlos Drummond de Andrade, naquele momento eu somente queria esquecer que no meu caminho havia uma pedra.
Era uma noite fria. Eu havia somente feito um lanche no refeitório. Um leite com café quente e um prato com dois pães de queijo e um pedaço de broa me caíram bem. Havia um casal no refeitório. Estavam alegres, eram jovens, pareciam ter seus vinte e poucos anos. Estavam animados com as descobertas poéticas que estavam fazendo dentro e foram do hotel.
Em seguida, após os passos terminarem eu abro a porta para ela. Seu rosto era belo, suave, seus olhos eram castanhos e sua pele clara e rosada. Seu cabelo castanho e ondulado estava amarrado. Seu “boa noite” me faz ser o mais gentil que poderia ser naquela noite. Pego o copo com água e os remédios que estava aguardando. Agradeço e a despeço respeitosamente.
Ana Paula deveria estar comigo. Se ela estivesse vindo eu não teria pedido o hotel para comprar um remédio para dormir. Talvez se eu não tivesse comprado o jornal, se eu não tivesse visto a foto, provavelmente eu não teria largado minha casa e vindo para o hotel. Minha consciência me tortura. A dor e culpa me fazem recriar o que nunca saberei como ao certo foi o sofrimento de Ana naquele quarto, sendo estuprada, dopada, surrada até não ter mais vida. A queimação arde em meu estômago junto com a ausência da única mulher que amei e desejei por ela tirar todas as pedras do nosso caminho que por toda minha vida encontrarmos.

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